28 fevereiro 2018

procura a LUZ!!!



Xavier Rudd - Follow The Sun

CURTA INTRODUÇÃO
Procuro fugir ao moralismo, embora saibamos os dois que todos temos a nossa moral (e todos convivemos com ela diariamente) e que por muito que fujamos a ela ao falarmos na vida ela pode emergir...

Toda a gente tem os seus dilemas, olha à tua volta, sai de ti e vê o outro: 'Eu sou porque nós somos!'
Há um conjunto de gestos habituais ou novos que fazes no dia a dia e dependem dos outros.
Faz sorrir, é bom: e não é difícil acederes ao outro.
Olha para o alto e para a frente;
Um jardim ao sol, inspirar e expirar (só) é fascinante mudar tanto como o tempo (dias, meses, anos e séculos), o Mar sempre belo.
Se ficarmos apenas a observar a nossa vida por mais que seja preenchente, é pouco, não satisfaz!
De diferentes maneiras e perspectivas há sempre coisas a descobrir.


PROCURA A LUZ! 



Toda a gente tem os seus dilemas, maiores ou menores, TODA a gente faz asneiras, transforma qualidades em defeitos e vice versa. 

Olha à tua volta e se encontrares alguém que não os tenha, algo está errado na tua forma de olhar.

Há um conjunto de gestos habituais ou novos que fazes no dia a dia e dependem dos outros: as refeições, festas, celebrações, cuidados de saúde, educacionais; de lazer, profissionais, etecetera e tal, tudo na vida implica para querermos ser melhor demonstrarmos essa vontade.

Sai de ti e vê o outro, é um bom exercício para o teu altruísmo e leva-te a fugir a ti, o nosso EU que dá muito trabalho e ganha leveza se te distraíres do umbiguismo matreiro, ajuda-te a fugir desse ensimesmanço.

'Eu sou porque nós somos!', diziam-te no outro dia; é connosco, é a nossa responsabilidade fazermos porque o momento seja melhor e procurar onde nos encaixar no corpo social.

E ajudarmos a que o momento do outro seja melhor é gira ocupação, faz sorrir, é bom.

E não é difícil acederes ao outro, (os computadores, e-mails e redes sociais são limitados!) tudo na nossa sociedade é feito por alguém neste espaço e neste tempo, não te refugies e feches nessa concha fechada e apertada.

Olha para o alto e para a frente, olha para fora, há tanta coisa bonita a acontecer na vida!

Um jardim ao sol: tem tanta vida, cor, cheiros, sentimentos; animais voadores e rasteiros e plantas floridas e que vegetam, dá para fazeres poesia, há quem faça ciência e estudos disso!

O Mar mudar tanto como o tempo  (dias, meses, anos e séculos) sempre belo inventando correntes e ondas, novas tons e cores pela costa toda até ao céu.

Inspirar e expirar (só) é fascinante!

Se ficarmos apenas a observar a nossa vida por mais que seja preenchente, é pouco, não satisfaz! não chega para veres tudo andando depressa ou aproveitando melhor a lentidão do caminho, não chega para ver o filme todo mas vai desfrutando do que puderes aproveitar dele/nele.

E há sempre coisas a descobrir olhando lá para fora de diferentes maneiras e perspectivas.

Quando estiveres desanimada pensa de novo em olhar de novo, há sempre coisas a descobrir.

Há algum tempo disseste-me numa viagem para eu 'procurar a luz!', a nossa vida pode ser entendida como uma viagem e digo-te o mesmo: 'PROCURA A LUZ! 

26 fevereiro 2018

Imaginar é bom, barato e é livre



 - Chico Buarque e Tom Jobim

Imagina
Imagina
Hoje à noite
A gente se perder
Imagina
Imagina
Hoje à noite
A lua se apagar
Quem já viu a lua gris
Quando a lua começa a murchar
Lua cris
É preciso gritar e correr, socorrer o luar
Meu amor
Abre a porta pra noite passar
E olha o sol
Da manhã
Olha a chuva
Olha a chuva, olha o sol, olha o dia a lançar
Serpentinas
Serpentinas pelo céu
Sete fitas
Coloridas
Sete vias
Sete vidas
Avenidas
Pra qualquer lugar
Imagina
Imagina

Sabe que o menino que passar debaixo do arco-íris
vira
moça, vira
A menina que cruzar de volta o arco-íris rapidinho
volta a ser rapaz
A menina que passou no arco era o 
Menino que passou no arco
E vai virar menina
Imagina
Imagina
Imagina

Imagina
Imagina
Hoje à noite
A gente se perder
Imagina
Imagina
Hoje à noite
A lua se apagar

maria rita - a história de lily braun



Como num romance 
O homem dos meus sonhos
Me apareceu dancing 
Era mais um
Só que num relance 
Os seus olhos me chuparam
Feito um zoom
Ele me comia 
Com aqueles olhos
De comer fotografia 
Eu disse X
E de close em close
Fui perdendo a pose
E até sorri, feliz

E voltou
Me ofereceu um drinque 
Me chamou de anjo azul
Minha visão
Foi desde então ficando flou

Como no cinema
Me mandava às vezes
Uma rosa e um poema 
Foco de luz
Eu, feito uma gema 
Me desmilinguindo toda
Ao som do blues
Abusou do scoth 
Disse que meu corpo
Era só dele aquela noite 
Eu disse please
Xale no decote 
Disparei com as faces
Rubras e febris

E voltou 
No derradeiro show 
Com dez poemas e um buquê
Eu disse adeus 
Já vou com os meus 
Pra uma turnê
Como amar esposa 
Disse ele que agora
Só me amava como esposa 
Não como star
Me amassou as rosas 
Me queimou as fotos
Me beijou no altar
Nunca mais romance 
Nunca mais cinema
Nunca mais drinque no dancing Nunca mais cheese
Nunca uma espelunca 
Uma rosa nunca
Nunca mais feliz
Nunca mais romance 
Nunca mais cinema
Nunca mais drinque no dancing Nunca mais cheese
Nunca uma espelunca 
Uma rosa nunca
Nunca mais feliz

Maria Gadú - Meu caro barão (de Chico Buarque)



É curtida: é usada num filme em que os trapalhões acham uma máquina de escrever e como não sabem usar/escrever fazem erros e versos que concordam pouco.


Onde quer que esteja
Meu caro Barão
São Brás o proteja
O santo dos ladrão
Tava na faxina
Do seu caminhão
Vi essa maquina
De escrever no chão
Escovei a nega
Lavei com sabão
Deu uma cócega
Nos calo da mão
Pronto
Ponto
Tracinho, tração
Linha
Margem
Meu caro Barão

Vire a página
Continuação
Ai, essa máquina
Tá que tá que é bão
Como eu lhe dizia
Meu caro Barão
A sua ausência
É uma sensação
O circo lotado
Cidade e sertão
Domingo, sábado
Inverno e verão
Pronto
Ponto
De exclamação
Linha
Margem
Meu caro Barão

Tem gargalhada
Tem sim senhor
Tem muita estrada
Tem muita dor
Venha, Excelência
Nos visitar
Estamos sempre
Noutro lugar

Dizem que vírgula
Aspas, travessão
Coisa ridícula
Dizem que o Barão
Que o Barão, meu caro
Tinha a faca, o pão
O queijo e os passaros
Voando e na mão
Pois eu tenho ouvido
Que o pobretão
Tá magro, palido
Sem ocupação
Pronto
Ponto
De interrogação
Linha
Margem
Meu caro Barão

Venha, Excelência
Nos visitar
A casa é sempre
De quem chegar
Se a senhoria
Vem pra ficar
Basta algum dia
Se preparar

Pra rodar com a gente
Pra fazer serão
Pra ficar contente
Comer macarrão
Pra pregar sarrafo
Pra lavar leão
Pra datilógrafo
Bilheteiro, não
Pra fazer faxina
Nesse caminhão
Cuidar da máquina
E não ser mais Barão
Linha
Margem
Etcétera e tal
Pronto
Ponto
E ponto final


PROCURA A LUZ!



Xavier Rudd - Follow The Sun

CURTA INTRODUÇÃO
Procuro fugir ao moralismo, embora saibamos os dois que todos temos a nossa moral (e todos convivemos com ela diariamente) e que por muito que fujamos a ela ao falarmos na vida ela pode emergir...

Toda a gente tem os seus dilemas, olha à tua volta, sai de ti e vê o outro: 'Eu sou porque nós somos!'
Há um conjunto de gestos habituais ou novos que fazes no dia a dia e dependem dos outros.
Faz sorrir, é bom: e não é difícil acederes ao outro.
Olha para o alto e para a frente;
Um jardim ao sol, inspirar e expirar (só) é fascinante mudar tanto como o tempo (dias, meses, anos e séculos), o Mar sempre belo.
Se ficarmos apenas a observar a nossa vida por mais que seja preenchente, é pouco, não satisfaz!
De diferentes maneiras e perspectivas há sempre coisas a descobrir.


PROCURA A LUZ! 



Toda a gente tem os seus dilemas, maiores ou menores, TODA a gente faz asneiras, transforma qualidades em defeitos e vice versa. 

Olha à tua volta e se encontrares alguém que não os tenha, algo está errado na tua forma de olhar.

Há um conjunto de gestos habituais ou novos que fazes no dia a dia e dependem dos outros: as refeições, festas, celebrações, cuidados de saúde, educacionais; de lazer, profissionais, etecetera e tal, tudo na vida implica para querermos ser melhor demonstrarmos essa vontade.

Sai de ti e vê o outro, é um bom exercício para o teu altruísmo e leva-te a fugir a ti, o nosso EU que dá muito trabalho e ganha leveza se te distraíres do umbiguismo matreiro, ajuda-te a fugir desse ensimesmanço.

'Eu sou porque nós somos!', diziam-te no outro dia; é connosco, é a nossa responsabilidade fazermos porque o momento seja melhor e procurar onde nos encaixar no corpo social.

E ajudarmos a que o momento do outro seja melhor é gira ocupação, faz sorrir, é bom.

E não é difícil acederes ao outro, (os computadores, e-mails e redes sociais são limitados!) tudo na nossa sociedade é feito por alguém neste espaço e neste tempo, não te refugies e feches nessa concha fechada e apertada.

Olha para o alto e para a frente, olha para fora, há tanta coisa bonita a acontecer na vida!

Um jardim ao sol: tem tanta vida, cor, cheiros, sentimentos; animais voadores e rasteiros e plantas floridas e que vegetam, dá para fazeres poesia, há quem faça ciência e estudos disso!

O Mar mudar tanto como o tempo  (dias, meses, anos e séculos) sempre belo inventando correntes e ondas, novas tons e cores pela costa toda até ao céu.

Inspirar e expirar (só) é fascinante!

Se ficarmos apenas a observar a nossa vida por mais que seja preenchente, é pouco, não satisfaz! não chega para veres tudo andando depressa ou aproveitando melhor a lentidão do caminho, não chega para ver o filme todo mas vai desfrutando do que puderes aproveitar dele/nele.

E há sempre coisas a descobrir olhando lá para fora de diferentes maneiras e perspectivas.

Quando estiveres desanimada pensa de novo em olhar de novo, há sempre coisas a descobrir.

Há algum tempo disseste-me numa viagem para eu 'procurar a luz!', a nossa vida pode ser entendida como uma viagem e digo-te o mesmo: 'PROCURA A LUZ! 

22 fevereiro 2018

Escrito para impedir maus pensamentos... (Doors na coluna)

Navegavam sem o mapa que faziam, 

(de Sophia de Mello Breyner Andresen)

(Atrás deixando conluios e conversas)
Os homens sábios tinham concluído
Que só podia haver o já sabido:
Para a frente era só o inavegável
Sob o calor de um sol inabitável

Indecifrada escrita de outros astros
No silêncio das zonas nebulosas
Trémula a bússola tacteava espaços

Depois surgiram as costas luminosas
Silêncios e palmares frescor ardente
E o brilho do visível frente a frente

In:
[“As ilhas”, VI, Navegações]
1983
Sophia de Mello Breyner Andresen
(1919-2004)

Sophia escrevia sobre o tempo assombroso das descobertas, como é todo e qualquer futuro um não saber para onde iam e Camões apelidou de um largo mundo alumiado.

Toda e qualquer vida parte de um aprender constante a viver e a procurar-se.

Quem julga saber mais deve sempre questionar-se se o mundo em que vive já foi todo descoberto.

21 fevereiro 2018

Há sempre passados a viver em nós

Há sempre passados a viver em nós, coisas que podiam ter sido e não foram, piores e/ou melhores,  mas seguramente diferentes ou nunca são como supúnhamos mas é vida

Há sempre passados a viver em nós, há gente e passados que vive melhor com quem fomos, gente que nem dá por eles, gente que vive excessivamente nesse passado.

Há sempre passados a viver em nós, na realidade, somos muito as horas, o tempo, lugares, o espaço, com quem estamos, a família e os amigos... temos responsabilidade de nos tornarmos melhores, ir evoluindo, melhorar é connosco.

Há sempre passados a viver em nós, e aqui surge a ideia de não haver coitadinhos associada ao se fosse fácil não tinha piada: ninguém gosta de jogos fáceis e a vida tem o desafio de ser complicada e difícil e por isso é boa e para desfrutar, estar à altura do que ela nos propõe sem baixarmos os braços à luta.

Há sempre passados a viver em nós, porque o futuro ainda não existe e o presente já foi, somos passado, embora gostemos muito da ideia de querer ser futuro!


O trauma da morada (Por Miguel Esteves Cardoso)

Um dos grandes problemas da nossa sociedade é o trauma da morada. Por exemplo, há uns anos, um grande amigo meu, que morava em Sete Rios, comprou um andar em Carnaxide. 
Fica pertíssimo de Lisboa, é agradável, tem árvores e cafés. Só tinha um problema. Era em Carnaxide.
Nunca mais ninguém o viu.
Para quem vive em Lisboa, tinha emigrado para a Mauritânia!

Acontece o mesmo com todos os sítios acabados em -ide, como Carnide e Moscavide. Rimam com Tide e com Pide e as pessoas não lhes ligam pevide.

Um palácio com sessenta quartos em Carnide é sempre mais traumático do que umas águas-furtadas em Cascais. É a injustiça do endereço.

Está-se numa festa e as pessoas perguntam, por boa educação ou por curiosidade, onde é que vivemos. O tamanho e a arquitectura da casa não interessam. Mas morre imediatamente quem disser que mora em Massamá, Brandoa, Cumeada, Agualva-Cacém, Abuxarda, Alfornelos, Murtosa, Angeja… ou em qualquer outro sítio que soe à toponímia de Angola.

Para não falar na Cova da Piedade, na Coina, no Fogueteiro e na Cruz de Pau. (...)

Ao ler os nomes de alguns sítios – Penedo, Magoito, Porrais, Venda das Raparigas, compreende-se porque é que Portugal não está preparado para estar na Europa.

De facto, com sítios chamados Finca Joelhos (concelho de Avis) e Deixa o Resto (Santiago do Cacém), como é que a Europa nos vai considerar?

Compreende-se logo que o trauma de viver na Damaia ou na Reboleira não é nada comparado com certos nomes portugueses.
Imagine-se o impacte de dizer "Eu sou da Margalha" (Gavião) no meio de um jantar.

Veja-se a cena num chá dançante em que um rapaz pergunta delicadamente "E a menina de onde é?", e a menina diz: "Eu sou da Fonte da Rata" (Espinho).

Já para não falar em “Picha”, no concelho de Pedrógão Grande e de “Rata”, em Arruda dos Vinhos, Beja, Castelo de Paiva, Espinho, Maia, Melgaço, Montemor-o-Novo, Santarém, Santiago do Cacém e Tondela.

Temos, assim, em Portugal, uma “Picha” para 11 “Ratas”. O que vale é que mesmo ao lado da “Picha”, temos a “Venda da Gaita”...
E ainda existe “Colhões”, perto de Coimbra,

E suponhamos que, para aliviar, o senhor prossiga, perguntando "E onde mora, presentemente?", Só para ouvir dizer que a senhora habita na Herdade da Chouriça (Estremoz).

É terrível. O que não será o choque psicológico da criança que acorda, logo depois do parto, para verificar que acaba de nascer na localidade de Vergão Fundeiro?

Vergão Fundeiro, que fica no concelho de Proença-a-Nova, parece o nome de uma versão transmontana do “Garganta Funda”.

Aliás, que se pode dizer de um país que conta não com uma Vergadela (em Braga), mas com duas, contando com a Vergadela de Santo Tirso?

Será ou não exagerado relatar a existência, no concelho de Arouca, de uma Vergadelas?

É evidente, na nossa cultura, que existe o trauma da "terra".

Ninguém é do Porto ou de Lisboa.

Toda a gente é de outra terra qualquer. Geralmente, como veremos, a nossa terra tem um nome profundamente embaraçante, daqueles que fazem apetecer mentir.

Qualquer bilhete de identidade fica comprometido pela indicação de naturalidade que reze Fonte do Bebe e Vai-te (Oliveira do Bairro).
É absolutamente impossível explicar este acidente da natureza a amigos estrangeiros ("I am from the Fountain of Drink and Go Away...").

Apresente-se no aeroporto com o cartão de desembarque a denunciá-lo como sendo originário de Filha Boa.

Verá que não é bem atendido. Não há limites. Há até um lugar chamado Cabrão, no concelho de Ponte de Lima !!!

Urge proceder à renomeação de todos estes apeadeiros.

Há que dar-lhes nomes civilizados e europeus, ou então parecidos com os nomes dos restaurantes giraços, tipo : Não Sei, A Mousse é Caseira, Vai Mais um Rissol. (...)

Também deve ser difícil arranjar outro país onde se possa fazer um Percurso que vá da Fome Aguda à Carne Assada (Sintra) passando pelo Corte Pão e Água (Mértola), sem passar por Poriço (Vila Verde), e acabando a comprar rebuçados em Bombom do Bogadouro (Amarante), depois de ter parado para fazer um chichi em Alçaperna (Lousã).

19 fevereiro 2018

Vamos continuar a fingir que é só futebol? (Rui Tavares, Historiador)

Os argumentos para o tribalismo no futebol são iguais aos argumentos de qualquer outro tribalismo: “os nossos primeiro”, “tornar-nos grande outra vez”, “todos atrás do nosso interesse supremo”. Quem discordar é traidor. Quem estiver do outro lado é inimigo.

Este fim-de-semana houve um congresso de um dos grandes partidos portugueses e uma assembleia-geral de um dos grandes clubes de futebol portugueses. As coisas estão muito mal para todos quando é do segundo acontecimento que temos de falar.

Ora, na dita assembleia-geral o presidente do clube de futebol exigiu aos sócios e adeptos que deixassem de consumir qualquer informação pela imprensa, rádio e TV que não fosse a informação do clube ou os conteúdos da TV do clube. Ato contínuo, jornalistas foram assediados por adeptos presentes na assembleia e tiveram de ser protegidos pela polícia. O que diríamos se tivesse sido um líder político a dizer estas palavras? O que diríamos se tivesse sido uma seita religiosa a praticar estes atos? O que diríamos se isto acontecesse na academia?

Como é futebol, apenas o Sindicato dos Jornalistas emitiu um comunicado — com o qual, passadas muitas horas, ainda nenhuma autoridade política ou partidária se solidarizou.

Vale a pergunta: podemos continuar a ignorar o que se passa no futebol português como sendo “apenas futebol”? Até quando fingiremos que a cultura em torno do dirigismo desportivo em Portugal não está profundamente doente? Sei que é tentador fazê-lo. Só que a complacência já se paga muito cara há muitos anos.

Não é de hoje que dirigentes do futebol português passam das marcas, sejam elas as da decência, da legalidade ou do estado de direito. E o problema não é apenas deste clube ou daquele. É uma culpa geral, agravada nos três maiores clubes nacionais. Há muitos anos que dirigentes desportivos destes, a coberto de simbolizarem clubes a que milhões de nós estão afetivamente ligados, conseguem que se feche os olhos aos seus esquemas manhosos e às suas fortunas suspeitas. Que agora cheguem ao ponto de fazer exigências de comportamento dignas de um qualquer aiatolá, fomentando um discurso de ódio contra os jornalistas, é só mais um passo num abismo moral antigo e com culpas partilhadíssimas. É mais um passo, mas não é um detalhe: a liberdade de imprensa é essencial em democracia. Claro que a liberdade de expressão, que inclui a liberdade de criticar a imprensa, também o é. Mas tentar condicionar o acesso à informação e o próprio exercício do jornalismo já não é liberdade e não é aceitável em democracia. Que tantos fiquem calados agora, quando certamente falariam se se tratasse de um caso político, religioso ou académico, é sinal de que a auto-censura funciona.

É óbvio que o futebol representa para muitos de nós uma reserva de irracionalidade. Não vem grande mal ao mundo que assim seja. Mas reservas de irracionalidade como a paixão clubística, como os ciúmes ou como o ódio, têm de ser mantidas dentro de um perímetro em que não possam fazer mal a terceiros. Esse perímetro deve ser guardado por todos os que tenham sensatez suficiente para trazer as pessoas de volta à realidade — melhor ainda se essas vozes sensatas forem de adeptos de futebol, e adeptos dos clubes em questão. Há um ponto a partir do qual o silêncio é cumplicidade com tudo o que possa vir a acontecer. A prova de que já vamos tarde é que há vários anos se firmou uma crença de que, para ganhar ou “para ser respeitado”, os dirigentes têm de ser assim. E os argumentos para o tribalismo no futebol são iguais aos argumentos de qualquer outro tribalismo: “os nossos primeiro”, “tornar-nos grande outra vez”, “todos atrás do nosso interesse supremo”. Quem discordar é traidor. Quem estiver do outro lado é inimigo.

Se o futebol fosse coisa pouca em Portugal — se movimentasse pouco dinheiro, se ocupasse poucas horas de televisão — isto seria só ridículo. Mas enquanto escrevia esta crónica chegaram as instruções do presidente do clube na especificidade: nada de ler ou partilhar artigos da imprensa que o clube não controla ou de ver televisão que não seja a TV do clube, enquanto “eles” não respeitarem os “três milhões e meio” de adeptos do clube. A primeira parte poderia fazer-nos rir. A segunda é mais preocupante. Estes dirigentes acham mesmo que por sermos adeptos dos clubes que eles transitoriamente dirigem podemos ser utilizados como uma massa indistinta para condicionar jornalistas.

Ou seja, estes dirigentes têm uma fraca opinião dos adeptos dos seus clubes: esquecem que os tais milhões de que eles falam são pessoas que pensam pela sua cabeça. Pessoas que pensam pela sua cabeça e que agora terão de pôr limites a esta insanidade, se quiserem que o futebol não possa intimidar nem a imprensa, nem as autoridades políticas, nem as autoridades judiciais.

17 fevereiro 2018

se eu fosse ... (António Guerreiro)


Se eu fosse paneleiro — na verdade, ninguém pode garantir que eu não seja, não tenha sido ou não venha a ser — e ocupasse um cargo político nunca aceitaria o protocolo da confissão, dizer o que se é àqueles que o não são. Não para manter o “segredo”, mas para não me submeter à regra da autentificação pelo discurso da verdade, tão aplaudido pelos que acham que a sua verdade é diariamente autentificada pelas evidências. 

Se eu fosse paneleiro — para usar uma forma especulativa que pode referir-se ou não a um estado de facto — também amaldiçoaria o dia em que, por palavras ou actos, me deixasse sujeitar pelo discurso odioso dos que descobriram que o seu alto teor de aceitação da homossexualidade é uma marca de distinção — de modernidade, de progressismo, de “estilo” — e um capital cultural para ser exibido publicamente, sobretudo quando lhes é oferecido o exemplo do homossexual bonzinho e ao serviço da homonormatividade, o amigo gay que todos temos. 

Se eu fosse paneleiro — e, dizendo isto, não estarei já a inscrever-me numa “homossexualidade molecular”? — o que eu não riria da homofilia editorial do Expresso,
que anunciava a “confissão” do dirigente do CDS como uma notícia que não devia ser notícia mas que ainda tem de ser notícia. O que se pode ler nesta fórmula retorcida é que obter de alguém a afirmação “eu sou gay” merece sempre uma nota editorial, que é a notícia da notícia, ou a notícia que reflecte sobre si própria para dizer que aquilo só é notícia para alguns atrasados, ignorantes e preconceituosos que a vão tratar como tal, apesar de ela ser feita por quem acha que não devia ali haver notícia alguma. É notícia porque “o mundo é o que é, o país é o que é, a sociedade em que estamos inseridos é o que é”, reafirma um jornalista noutra página do mesmo jornal, também a propósito de Adolfo Mesquita Nunes. 

Se eu fosse paneleiro e pleno de perfídia — hoje, contraí um apego aos atributos que começam por “p” — diria gentilmente ao simpático autor desta proposição lógica que aquilo a que os franceses chamam “bêtise” (e que eu não vou traduzir por “estupidez” porque seria uma tradução pouco correcta e indelicada para o visado), pode ser exemplificado — dizem os tratados sobre tal matéria — pelo uso abusivo e hiperbólico do princípio da identidade, exibindo-o de maneira peremptória, como na frase “O mundo é o que é, o país é o que é”. E o que é um gay hoje, daqueles que fazem os jornais, as revistas e as televisões olharem para si próprios com orgulho por estarem tão à frente do país que “é o que é”? É uma marca, uma sexualidade branca ou um turista do sexo, conforme a um modelo unissexual. 

Se eu fosse paneleiro e político — malditos “pês”, que afluem como em hora de ponta, salvo seja — ficaria sempre calado para não ser transformado num estereótipo do homossexual de Estado, a não ser que aspirasse precisamente a essa condição. O que o Expresso revelava este fim de semana como uma verdade de primeira página é afinal uma mentira: Adolfo Mesquita Nunes não assumiu nada porque também não há nada a dissimular, não mostrou nada porque já não há nada a mostrar. O único objectivo que alcançou foi ter deixado que fizessem dele um cromo do ideal do Kitsch. Se eu fosse paneleiro — estribilho infame a que vou pôr fim — teria exultado com o que vi este fim-de-semana: o “orgulho gay” instalado em jeito de parada no Expresso, reivindicado no editorial, e gritado como palavra de ordem pela presidente do CDS.

 NOTA: No título, a palavra “paneleiro” é substituída por três pontos. Não por motivos de censura ou auto-censura, mas porque seria um foco de atracção dos clicks. Antes paneleiro que populista.