Como Fernando Pessoa inspirou Alexander Search.
Um livro da poesia inglesa de Fernando Pessoa foi o gatilho para a criação de uma banda de rock, Alexander Search, em que os músicos, tal como o poeta, assumem personagens e cujo álbum de estreia foi editado em 01.07.2017 (agorinha: tem menos de um ano).
Um livro da poesia inglesa de Fernando Pessoa foi o gatilho para a criação de uma banda de rock, Alexander Search, em que os músicos, tal como o poeta, assumem personagens e cujo álbum de estreia foi editado em 01.07.2017 (agorinha: tem menos de um ano).
Alexander Search é o nome do projecto, do disco de estreia e também é o nome de um dos heterónimos ingleses de Fernando Pessoa, “pessoa inspiradora” para o pianista e compositor Júlio Resende.
“Uma vez comprei um livro da poesia inglesa de Fernando Pessoa, fiquei muito tocado e muito perturbado com o que li, e inspirou-me para trazer ao de cima uma ideia antiga de ter uma banda de rock, com letras em inglês”, contou Júlio Resende, em entrevista à agência Lusa.
Há cerca de dois anos, o músico começou “a construir canções, uma atrás da outra”, tendo depois chamado quatro “companheiros de viagem musical”, o cantor Salvador Sobral, o músico eletrónico André Nascimento, o baterista Joel Silva e o guitarrista Daniel Neto.
Alguns poemas foram usados na íntegra, mas outros não. “Isto é música, as letras foram sacrificadas à música, porque é um disco. A música é o primordial aqui”, referiu Júlio Resende, considerando que “a carga juvenil e rebelde, nalguns dos poemas”, remete para o rock.
“A poesia só por si tem uma atitude rock, de alguma catarse”, defendeu.
O pianista é secundado por Salvador Sobral, para quem a poesia em causa “é uma poesia de Fernando Pessoa que está viva, imatura também às vezes, rebelde e inconsciente na sua adolescência, inocente também”. “Acho a música rock super adaptável a este tipo de poesia”, disse.
Na banda, cada um dos músicos assume uma personagem, que, segundo Júlio Resende, “está continuamente em processo, como estavam as personagens de Fernando Pessoa”.
Salvador Sobral “foi o primeiro a encontrar uma identidade mais assinalável” – Benjamin Cymbra.
“Adorei logo a ideia, gosto de sair de mim, de ser outra pessoa, com outras características de personalidade, outras roupas que nunca usaria o Salvador Sobral”, afirmou entusiasmado à agência Lusa.
“Adorei logo a ideia, gosto de sair de mim, de ser outra pessoa, com outras características de personalidade, outras roupas que nunca usaria o Salvador Sobral”, afirmou entusiasmado à agência Lusa.
Com a ajuda da figurinista Maria Gonzaga, criou a roupa de Benjamin Cymbra, “um fato de época do fim do século XIX, inicio do século XX”, que veste nas atuações.
Salvador Sobral idealizou Benjamin Cymbra “mais sério em palco”, ao contrário dele que é “super louco”. “Mas percebi que, no palco, não dá para fugir muito de mim, porque sou eu e quero expressar-me daquela maneira. Achei que ele podia ser mais sério, mas não consegui. Então ele é muito posto, mas quando chega ao palco sou sempre eu”, confessou.
Benjamin Cymbra tem características de personalidade que Salvador gostava que fossem suas: “É mais comedido, uma pessoa super ponderada, mais sensata”. “Eu gostava de ser não tão impulsivo ou não tão inconsequente”, partilhou.
Já Júlio Resende criou Augustus Search, “um pescador de Province Town, cidade piscatória norte-americana para onde foram muitos portugueses” e onde o pianista “esteve para nascer”. “Achei piada a isso e transformei-me em Augustus, pescador. Tudo o resto da biografia está um pouco em construção. A personalidade está a ser construída e a do Júlio também, felizmente”, referiu.
A “possibilidade de mutação, aceitar a mudança e a incoerência” agradam a Júlio Resende. “Acho que o rock e a incoerência estão também ligados”, disse. E Salvador Sobral reforça: “A própria poesia de Fernando Pessoa sempre foi muito incoerente”.
“Ele não se importava de contrariar-se no mesmo poema. Acho que até há um poema que fala de contradição e eu adoro isso. Uma pessoa que não tem medo de contrariar-se e que se contraria no próprio poema é genial, só um génio é capaz de fazer isso”, defendeu o cantor.
No projeto há mais três personagens: Sgt. William Byng (André Nascimento), Mr. Tagus (Joel Silva) e Marvell K. (Daniel Neto).
Para encontrar o vocalista, Júlio Resende avaliou “30 candidatos”. “Houve pessoas a cantar canções da Eurovisão, mas há dois anos as músicas não eram grande coisa. Desses escolhi 15 e disse: aquele que pagar mais fica na banda e assim foi, como sabem ele é um homem abastado”, contou o pianista, com ironia, fazendo referência à vitória de Salvador Sobral este ano, no Festival Eurovisão da Canção, que o colocou sob forte atenção mediática.
Salvador Sobral corrobora a fantasia, mas sublinha que é rico “em outras coisas”. “Quando vou na estrada, tenho um carro do ano 2000, as pessoas olham para mim e perguntam: ‘Como é que tens esse carro?’ Acham que uma pessoa aparece na televisão e é riquíssima”, contou.
A estreia dos Alexander Search ao vivo está marcada para 13 de julho, no festival Super Bock Super Rock, em Lisboa, no entanto a banda atuou em novembro de 2016, na Casa Fernando Pessoa, no encerramento do ciclo “Dias do Desassossego”.
Quem achar que poderá ouvir no festival o tema “Amar pelos dois”, que deu a Salvador Sobral a vitória na Eurovisão, desengane-se.
No concerto “não haverá espaço para nada” dos outros projetos dos cinco músicos, tal como nos outros espetáculos “também não há espaço para Alexander Search”, que é só mesmo rock com palavras de Pessoa.
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