04 julho 2021

Calígula morreu. Eu não



Não saberei exprimir a sensação... é muito sentida: foi Lindíssimo!!!

Calígula é uma peça escrita por Albert Camus iniciada em 1938 e publicada em 1944.

Foi reescrito por Cláudia Cedó (Espanha), encenado por Marco Paiva e produzido pela companhia portuguesa Terra Amarela formando outra peça mas assente na passada e é uma experiência ir assistir a esta peça.

Põe em causa todas as noções do tempo e espaço habituais que possas ter, é um espetáculo feito, maioritariamente, com gente deficiente; o que já de si é, não deveria ser mas ainda é, um desafio NOTÁVEL.

8 Atores: trissomia XXI, uma pessoa muda. outra com os membros usados de outra forma, mais eficiente, entre outros; legendado automaticamente em português: o castelhano e o português.

Dá outra qualidade humana as várias limitações (capacidades/qualidades) a interagirem e superarem-se entre si num espetáculo produzido em conjunto.

Uma necessidade de libertação.

Pode tratar-se o despotismo de várias formas. São também muitas as possibilidades de o erradicar. Mas, na verdade, o despotismo é um vírus que se espalha desenfreadamente e sobre o qual não se tem nenhum controlo. Funciona como um enorme incêndio que se propaga rapidamente e transforma tudo em cinza.

Em Calígula morreu. Eu não, por um lado, pensa-se na ação despótica como um impulso. Um impulso cíclico que responde a uma necessidade de libertação, de esvaziamento, de autossatisfação. Por outro lado, tenta-se agir no sentido de erradicar esse mesmo despotismo. A proposta é a de resolver uma situação ficcional, recorrendo a outra situação ficcional. Calígula não morreu! É preciso perceber porquê. É preciso revistar a história, voltar a contá-la, entender onde errámos e tentar que ele finalmente morra.

Para isso, Marco Paiva dirige um elenco que reúne intérpretes com e sem deficiência e surdos, num espetáculo composto por uma equipa mista, portuguesa e espanhola, que junta dois teatros nacionais da península, o D. Maria II e o Centro Dramático Nacional de Madrid.

Na passada sexta feira, fui ao teatro ver esta peça, (Calígula morreu, Eu não) com a mera garantia de qualidade a ser dada por ter conhecido o encenador Marco Paiva num curso online ("Diálogo(s) e Deficiência(s): A construção de narrativas para a inclusão") em quatro sábados das 10h às 13h em que ele era formador.

Parece irrelevante (12 horas cativantes e enriquecedoras) mas não é: é um comunicador a desmistificar a deficiência e fá-lo bem, muito bem!

É um sedutor, que alicia com o olhar e seduz!

Tinha a certeza que o trabalho dele como encenador (sem pisar o palco) ia ser bom, espalhei publicidade o melhor que sei e pude; vai estar pouco tempo; e foi melhor do que o esperado, as expectativas eram altas mas o trabalho com o mundo deficiente é sublime e liberta energias.

O mundo admirável que nos mostraste: OBRIGADO!

Saímos todos da sala mais leves, contentes, melhores; enchíamos duas filas (13 pessoas) do lado direito da fila central, com acentos a separar porque há para aí um vírus.

Consegui juntar ali, como num piquenique, pessoas de várias zonas da vida: Ex colegas de licenciatura e workshops, filósofas, familiares cúmplices num fim de tarde solarengo e bonito lisboeta.

Esta peça devia ser obrigatória para toda a gente ver e dar valor à sua existência: os atores são todos muito bons, fantásticos!

E gostei dos pensamentos que me provocou! 

A distinção entre eficiente e deficiente já era mal entendida e depois de ver a peça  faz pensar que cada um de nós tem imenso para dar ao mundo... 

Faz-nos entrar noutra dimensão e pensar e pensar e sonhar! 

Não há coitadinhos: grande momento: tão bom!!!

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