Filipa Leal
Dizia-te
do minuto certo. Do minuto certo do amor. Dizia-te que queria olhar
para os teus olhos e ter a certeza que pensavas em mim. Que me pensavas
por dentro. Que era eu a tua fantasia, o teu banco de trás. O teu
desconforto de calças caídas, de pernas caídas, da rua que não estava
fechada porque nenhuma rua se fecha para o amor.
Na cidade do
meu sono, havia palmeiras onde alguns repetiam putas e charros e
atiravam pedras ao rio. Mas eu nunca gostei de clichés. Nem de quartos
de hotel. Nem de camas que não conheço. Eu nunca abri as pernas,
entendes? Nunca abri as pernas no liceu. Nunca abri as pernas aos
dezassete anos, de cigarro na mão. Eu nunca me comovi com o sonho de ser
tua. Eu nunca quis que ficasses, entendes? Que viesses. Queria que
quisesses de mim esse minuto certo, essa rua húmida de ser norte. Queria
que me quisesses certa, exacta, como o minuto onde me pudesses
encontrar. Eu nunca quis de ti uma continuidade, mas um alívio, uma
noção de ser gente, entendes? Eu nunca quis de ti o sonho do sono ou da
viagem. Nunca te pedi o pequeno-almoço, a ternura. Nunca te disse que me
abraçasses por trás, que adormecesses. Eu nunca quis que me desses casa
e filhos e lógica. Que me convidasses para dançar. Queria os teus olhos
a fecharem-se comigo por dentro e tu por dentro de mim.
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