11 junho 2017

A era do imprevisível - nunca como antes, se lê o futuro!

Não era previsível que a maioria dos cidadãos do Reino Unido votassem a favor da saída da União Europeia ou que Donald Trump fosse eleito Presidente dos Estados Unidos.

Não era previsível que um partido derrotado nas eleições legislativas em Portugal conseguisse um inédito apoio parlamentar dos partidos à sua esquerda para formar Governo, que esse Governo sobrevivesse até hoje, possa completar a legislatura e o partido em questão esteja em condições de alcançar a maioria absoluta nas próximas eleições.

(Por cá,  o mais certo é Costa não abandonar as mãos que o apoiaram...mesmo se já não vai precisar do apoio da esquerda para ter maioria absoluta, vê-se que ter que trabalhar com tanta diferença: BE, PCP e Verdes - ajuda à igualdade.)

Não era previsível que um candidato quase sem historial político ganhasse as presidenciais francesas e que o partido formado com base nessa candidatura se encontre à beira de alcançar o maior número de deputados no Parlamento, renovando radicalmente a paisagem política do país. E não era também previsível que a primeira-ministra britânica, a quem se vaticinava há menos de um mês uma folgada maioria em Westminster, tenha ficado dependente de um partido norte-irlandês para formar um novo Governo e levar por diante – em posição obviamente muito debilitada – a negociação do Brexit com a União Europeia. Não, não era de todo previsível.

(e May passou de prazo em Juin...)


Se cada caso é um caso, esta conjugação de imprevisibilidades, de volatilidades, num tão curto espaço de tempo, não deixa de ser perturbante, como se tivéssemos perdido as referências em que nos habituáramos a confiar, desde os instrumentos habituais de previsão e análise – sondagens, estudos de opinião – até à nossa própria percepção da realidade.

Tanto assim é que os próprios actores dos acontecimentos tendem a ser ultrapassados por eles, como vimos em Portugal com a anterior maioria governativa mas, sobretudo, como sucedeu por duas vezes no Reino Unido, com os clamorosos erros de previsão dos líderes conservadores: David Cameron ao apostar no referendo sobre o Brexit, convicto de que a maioria dos britânicos não desejavam sair da União Europeia (UE), ou a sua sucessora Theresa May, acreditando num triunfo eleitoral esmagador sobre os trabalhistas que lhe daria um trunfo decisivo no processo negocial com a Europa.

Pode dizer-se que May foi vítima da sua própria mediocridade política, da sua incoerência de princípios – apoiou, embora frouxamente, Cameron, também ele dúplice, aliás, quanto à permanência do Reino Unido na UE – ou do clima de tensão suscitado pelos atentados terroristas de Manchester e Londres. Mas o processo dos acontecimentos em apenas algumas semanas, contrariando a grande maioria das expectativas e convicções iniciais, mostra como a velocidade de propagação do imprevisível pode provocar um abalo sísmico do que supúnhamos ser as tendências solidamente implantadas da realidade.

Imprevisível, de facto, um líder tão pouco carismático e anacrónico como Jeremy Corbyn – típico representante do velho socialismo britânico de extracção trotskista – ter-se tornado, no tempo de uma campanha que deveria servir para enterrá-lo definitivamente, o emblema da insubordinação face a um remake amadorístico de Thatcher, como é May. As receitas arcaicas de Corbyn, com o regresso ao Estado providência e nacionalizador dos saudosos tempos do Labour, disfarçando o seu jogo duplo sobre o Brexit, acabaram por parecer quase uma ousadia refrescante face ao conservadorismo amorfo e enfatuado de May.

Não são apenas a pós-verdade e os «factos alternativos», tão caros a Trump, que estão em voga. Vivemos também numa era do imprevisível, em que as certezas aparentemente implantadas podem voar em estilhas por força do que nos surge – para o mal ou para o bem – como um sinal de mudança ou novidade. Nada se perde tudo se transforma.

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